sexta-feira, 17 de julho de 2009

Contributos para uma (nova) política cultural

Por razões que não são importantes para esta conversa, tive esta semana oportunidade de ter uma longa conversa com elementos da direcção do Mercado Negro. Este espaço faz este ano três anos de existência.

O Diário de Aveiro em 6 de Junho de 2006 noticiava desta forma a sua abertura: “… Vai surgir numa casa antiga, com vista privilegiada sobre o Canal Central. Com uma programação cultural regular e que visa conquistar um público que procure qualidade e algo pouco convencional, Mercado Negro inclui um pequeno auditório com capacidade para 90 pessoas, um café dividido por três salas que também podem servir como galeria de arte, a loja de música dB, a livraria O Navio de Espelhos, a loja Lollipop, a loja de design Miyabi, que promete apostar em peças exclusivas de design mas também apoiar criadores nacionais, uma pequena uma sala de jogos e ainda a galeria de arte Poc de Tot que vai dar espaço e visibilidade aos novos criadores, em áreas tão diferentes como artes plásticas, joalharia, pronto-a-vestir, decoração, entre outras

Passado este tempo as lojas não são as mesmas, mas o espírito ainda lá habita, bem vivo.

Valeu (vale) a pena criar e manter este projecto cultural numa cidade com Aveiro? Foi a pergunta central a que era importante dar resposta.

Como em tantas ocasiões na área da cultura, escapa da boca dos protagonistas algum desapontamento em relação aos resultados expectáveis. Inovar é complicado em todas as áreas. Na cultura, é quase sempre um trabalho solitário, incompreendido, pelos que estão próximos, mas muitas vezes admirado quando visto de longe.

O que existe de novo no Mercado Negro é uma política de total ausência de subsídio-dependência.

É o preço da liberdade.

Não ouvi um comentário ou uma crítica à falta de apoio. Isto não implica que não tenham uma profunda consciência do papel cultural, formativo e inovador que desenvolveram durante estes anos, à margem do vazio da política cultural de uma cidade anestesiada.

É chegada a altura de se inverter o paradigma (digo eu):

não são as associações culturais que precisam de apoio, é a sociedade e os seus dirigentes, que assumiram o poder nas Câmaras e no Estado, que necessitam das associações para poderem cumprir cabalmente o seu papel na criação de uma melhor qualidade de vida das pessoas.

Como é qualquer actividade o futuro sustentado da actividade cultural, amadora, semi-profissional e profissional, passa pela implementação de contratos programa onde haja responsabilização das partes em relação a conjunto de acções mutuamente acordadas. Quem é profissional desenvolve um programa a tempo inteiro, quem não o é (e existe igualmente espaço para eles) apresentam planos compatíveis com as suas vidas.

Voltando ao Mercado, senti necessidade de saber com mais exactidão o que foi feito, e fiquei com uma enorme vergonha pela inércia, pelo cansaço que não fui capaz de evitar em nome da eficácia e de empenhamentos quase patéticos, na minha vida profissional. Lá fora da minha vida, corria um programa musical impressionante, que eu não desdenharia de desenhar, num plano teórico, se por acaso tivesse de falar sobre o que deveriam ser as componentes culturais de uma cidade moderna.

Para quem (como eu) não tenha tido energia para mais, encha-se de coragem e gaste o resto da sua energia a clicar em http://www.lastfm.com.br/venue/8825141. Poderá ouvir alguns dos artistas que passaram no Mercado Negro: Tiago Guillul (12/2/09), Butcher The Bar (22/01/09), The Partizan Seed(11/12/08)ou Kimya Dawson (21/05/09), gostei particularmente desta última artista.

Já clicou?

Pois é, foi mesmo aqui que passou tudo isso, em Aveiro(!) onde nos vamos vivendo auto-amordaçados pelo marasmo cultural dominante que nós aceitamos como se fosse um destino, uma fatalidade, algo que nos foi introduzido na alma durante 48 anos e que, para espanto de Darwin, talvez tenhamos herdado do nosso património genético.

Felizmente que, olhando para gente desta, ficamos com a certeza que o gene da passividade é outra das invenções dos passivos.

 

“A experiência é a cicatriz de todas as coisas”

Maria Velho da Costa (Casas Pardas)

Paulo Trincão

Apoiante do Movimento AdoroAveiro

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